Cuidado integral do AVC agudo: finalmente Ministério da Saúde autoriza SUS disponibilizar trombectomia mecânica (TM) aos usuários. Uma conquista enorme!

Inicialmente, doze hospitais receberão recursos do Ministério da Saúde (MS), via Sistema Único de Saúde (SUS), para o procedimento de trombectomia mecânica (TM).

Portaria do Ministério da Saúde: trombectomia mecânica (TM) para AVCi agudo em tabela do SUS – Imagens (acima, abaixo e da home): Reprodução/MS

 

Início de novos tempos da assistência ao Acidente Vascular Cerebral Isquêmico no Brasil. Por meio da portaria 1.996, de 24 de novembro de 2023, o Ministério da Saúde, enfim (enfim, porque a novidade já poderia ter se tornado realidade 11 anos atrás [em 2012]), incluiu na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS, o procedimento relativo à trombectomia mecânica para AVCi agudo.

São onze anos depois de a portaria inicial que implantou o financiamento do trombolítico no SUS. Oito após a chegada de evidências clínicas claras do tratamento endovascular no AVCi agudo (ano 2015; resultados de estudos de TM). Três anos distantes da publicação do estudo Resilient, na revista americana NEJM Catalyst Innovations in Care Delivery, apontada como a maior publicação científica sobre inovações nos cuidados à saúde. Dois anos depois da publicação da portaria ministerial que atestou a incorporação da Trombectomia no SUS (2021). O programa também foi destaque em Congressos.

A aprovação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) no Sistema Único de Saúde considerou também o Resilient, financiado pelo MS e realizado em 12 hospitais públicos brasileiros, que comparou a TM com o tratamento clínico até oito horas do início do AVC em 221 pacientes e demonstrou que a trombectomia aumenta muito a chance de o paciente ficar independente para as atividades diárias além de reduzir de 50% para 31% a chance de morte ou incapacidade grave.

Conforme publicando recentemente pelo JORNAL CIDADE, pelo fato de a técnica não ter sido disponibilizada, até outubro, para a população – sob aguardo longo da publicação do Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) pelo MS –, foi estimado que mais de 70 mil pessoas deixaram de ser tratadas e beneficiadas na rede pública pela TM, então disponibilizada apenas na opção particular.

 

12 hospitais

A tecnologia e o financiamento da trombectomia mecânica para AVC isquêmico por oclusão de grande artéria começa a chegar aos primeiros doze hospitais públicos brasileiros – Porto Alegre-RS (dois), São Paulo-SP (dois), Botucatu-SP, Campinas-SP, Ribeirão Preto-SP, São José do Rio Preto-SP, Brasília-DF, Fortaleza-CE, Joinville-SC e Vitória-ES.

Goiás, que ficou de fora da primeira etapa, bem poderia ter conquistado uma destinação, em empenho mais arrojado e determinado da parte da bancada federal. Uma causa dessa relevância em andamento e integrantes dela, no mesmíssimo período, trocando farpas totalmente desnecessárias em Redes sociais. É lamentável!

Vigorando já a partir de novembro, os denominados Centros de AVC inicialmente autorizados disporão aos pacientes do SUS o tratamento altamente eficaz.

Na mesma linha, a portaria ministerial também orienta como serão os procedimentos para credenciamentos de novos hospitais, conforme seu artigo 5º. Confira, abaixo, todo o conteúdo da portaria.

Quando não mata a vítima, o AVC pode levar a incapacidades neurológicas leves e passageiras ou graves.

 

Tratamento inovador

Segunda causa de morte e a primeira de incapacidade no mundo, o AVC ocorre quando há alteração na circulação sanguínea do cérebro. Ele pode ser isquêmico – quando um vaso sanguíneo no cérebro fica bloqueado devido a um coágulo ou trombo –, que é o tipo mais comum, correspondendo a 85% dos casos, ou o hemorrágico, quando a artéria se rompe e o sangue extravasa. Cerca de 70% dos indivíduos que sofrem AVC não retornam ao trabalho em razão das consequências da doença.

No SUS, até então, o único tratamento disponível para o AVCi era a Trombólise Endovenosa, injeção que dissolve os coágulos que entopem os vasos sanguíneos e deve ser aplicada em até 4,5h após os primeiros sintomas. Porém, há um problema no procedimento, pois quando os vasos são muito grandes, o medicamento não consegue penetrar o suficiente para dissolver os coágulos, assim a efetividade do tratamento diminui.

Minimamente invasiva, a TM complementa a trombólise, única opção disponível na rede pública de saúde, e nem sempre eficiente para os casos mais graves do AVCi. Além de segura e eficaz, uma das grandes vantagens da TM é que pode ser utilizada até 24 horas após os primeiros sintomas do AVC com sucesso, enquanto outras formas de tratamentos, como os medicamentos trombolíticos, têm uma janela restrita de indicação e sucesso somente até 4,5 horas depois das manifestações iniciais da doença.

A trombectomia mecânica consiste na desobstrução da artéria cerebral realizada por cateter que leva dispositivo endovascular, um stent ou sistema de aspiração, para remover o coágulo sanguíneo do cérebro. Com o procedimento, a taxa de recanalização na oclusão de grandes vasos chega a 77% (NOGUEIRA, 2018, WHITELEY, 2017), significativamente mais eficiente que o tratamento convencional de trombólise endovenosa, com 11% (TSIVGOULIS, 2018). A trombólise endovenosa, tratamento medicamentoso com uso de trombolítico, deve ser aplicado em até 4h30 após os primeiros sintomas, informa o médico, listando fontes.

A TM proporciona também melhor qualidade de vida ao paciente, aumentando a sua capacidade funcional (cognitiva e motora) e dando maior independência no pós-AVC. Estudos apontam ainda que 46% dos pacientes que foram submetidos a essa nova técnica se mostraram independentes após três meses de tratamento, contra apenas 26,5% do grupo que recebeu a trombólise endovenosa (GOYAL, 2016).

Foram considerados também dois estudos que avaliaram o tratamento até 24 horas, um deles, inclusive, liderado pelo brasileiro Raul Nogueira (neurologista chefe do Serviço de AVC da Universidade de Pittsburg), responsável pela pesquisa Dawn, publicada em 2018, realizada nos Estados Unidos. O ensaio clínico contou com 206 pacientes com AVC entre seis e 24 horas avaliados com tomografia com perfusão, que é capaz de verificar se ainda existe cérebro salvável mesmo com mais tempo do início dos sintomas do AVC. O estudo mostrou que, em pacientes selecionados entre seis-24 horas, após três meses do AVCi, 48,6% do grupo TM conseguiram seguir a vida de forma independente. No tratamento convencional o índice foi significativamente inferior, apenas 13,1% atingiram o mesmo patamar.

Em suma, a TM reduz as taxas de mortalidade, o tempo de internação, dá mais chances para a boa recuperação no pós-AVC e atenua em até três vezes as incapacidades neurológicas do AVC.

 

SBAVC

A Sociedade Brasileira de AVC (SBAVC) é a principal Sociedade Médica com representatividade brasileira que reúne profissionais (médicos, neurologistas, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, etc.) com interesse especial no estudo, na pesquisa e assistência ao Acidente Vascular Cerebral. Uma atuação de forma alinhada com o Departamento Científico de AVC da Academia Brasileira de Neurologia.

Fundada há 28 anos, com história que se confunde com a rápida evolução da especialidade ao longo de anos, desde o surgimento do tratamento trombolítico, até a evolução gradual das drogas e do arsenal terapêutico de prevenção secundária e das terapias de reperfusão no AVC agudo.

Nos dados da Sociedade, consta: ‘Temos como foco principal as ações de educação, prevenção, tratamento e reabilitação de pacientes com AVC, uma das principais causas de morte e incapacidade permanente em nosso País.’.

 

Portaria do Ministério da Saúde

DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO

Publicado em: 27/11/2023 | Edição: 224 | Seção: 1 | Página: 127

Órgão: Ministério da Saúde/Gabinete da Ministra

PORTARIA GM/MS Nº 1.996, DE 24 DE NOVEMBRO DE 2023

 

Inclui, na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do Sistema Único de Saúde – SUS, procedimento relativo à trombectomia mecânica para acidente vascular cerebral isquêmico agudo.

 

A MINISTRA DE ESTADO DA SAÚDE, no uso das atribuições que lhe conferem os incisos I e II do parágrafo único do art. 87 da Constituição, e

Considerando a Portaria SCTIE/MS nº 5, de 19 de fevereiro de 2021, que torna pública a decisão de incorporar a trombectomia mecânica para acidente vascular cerebral isquêmico agudo, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS;

Considerando a Portaria SCTIE/MS nº 79, de 31 de dezembro de 2021, que torna pública a decisão de ampliar, no âmbito do SUS, o uso da trombectomia mecânica para acidente vascular cerebral isquêmico agudo com janela de sintomas maior do que 8h e menor que 24h; e

Considerando a avaliação técnica do Departamento de Atenção Especializada e Temática (DAET/SAES/MS) e do Departamento de Regulação Assistencial e Controle (DRAC/SAES/MS), constante no NUP-SEI nº 25000.155890/2022-31, resolve:

Art. 1º Fica incluído, na Tabela de Habilitações do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), o código de habilitação 16.18 – Neurocirurgia Endovascular/Trombectomia Mecânica, conforme descrito no Anexo I.

Art. 2º Fica incluído, na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS, o procedimento, descrito no Anexo II.

Parágrafo único. Fica incluído o atributo Subtipo de Financiamento código 0084-Neurocirurgias na Tabela de Financiamento do FAEC.

Art. 3º Ficam incluídas as compatibilidades entre Procedimento AIH Principal X Procedimento AIH Especial na Tabela de Procedimentos, Medicamentos, Órteses, Próteses e Materiais Especiais do SUS, conforme o Anexo III.

Art. 4º Fica estabelecido que estarão habilitados para a realização do procedimento incluído pelo Art. 2º os estabelecimentos de saúde listados no Anexo IV.

Parágrafo único. Os estabelecimentos listados no Anexo IV foram selecionados com base nos seguintes critérios:

I – A sua participação no estudo Resilient, ensaio clínico randomizado multicêntrico financiado pelo Ministério da Saúde com vistas a avaliar a viabilidade do tratamento do acidente vascular cerebral isquêmico por trombectomia mecânica na comparação com o tratamento clínico padrão no contexto do Sistema Único de Saúde – SUS;

II – Habilitados como: 16.01 – Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Neurologia/Neurocirurgia ou 16.02 – Centro de Alta Complexidade em Neurologia/Neurocirurgia com o Serviço/Classificação: 105/007 – Serviço de Atenção em Neurologia/Neurocirurgia/Tratamento Endovascular; e

III – Habilitados como: 16.17 – Centro de Atendimento de Urgência Tipo III aos Pacientes com AVC.

Art. 5º A solicitação pelos gestores estaduais, distrital e municipais do SUS, para a habilitação de novos hospitais para a realização do procedimento incluído pelo Art. 2º deverá observar os seguintes critérios:

I – Habilitados como: 16.01 – Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Neurologia/Neurocirurgia ou 16.02 – Centro de Alta Complexidade em Neurologia/Neurocirurgia e com o Serviço/Classificação: 105/007 – Serviço de Atenção em Neurologia/Neurocirurgia/Tratamento Endovascular;

II – Habilitados como: 16.17 – Centro de Atendimento de Urgência Tipo III aos Pacientes com AVC; e

III – A homologação da solicitação de habilitação pela Comissão Intergestores Bipartite (CIB).

  • 1º A habilitação 16.18 – Neurocirurgia Endovascular/Trombectomia Mecânica, de que trata o caput será concedida após análise e aprovação dos pedidos cadastrados no Sistema de Apoio à Implementação de Políticas em Saúde (SAIPS) ou em qualquer outro que venha a substituí-lo.
  • 2º A homologação da habilitação de que trata o caput será publicada em Portaria no Diário Oficial da União.

Art. 6º Fica estabelecido recurso do Bloco de Manutenção das Ações e Serviços Públicos de Saúde – Grupo de Atenção Especializada, no montante anual estimado de R$ 73.956.757,00 (setenta e três milhões, novecentos e cinquenta e seis mil e setecentos e cinquenta e sete reais).

Art. 7º O Fundo Nacional de Saúde (FNS) adotará as medidas necessárias para a transferência dos valores mensais relativos ao procedimento de que trata esta Portaria aos Fundos de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios de acordo com a apuração da produção de serviços registrada na Base de Dados do Sistema de Informações Hospitalares – SIH/SUS, mediante processo autorizativo encaminhado pela Secretaria responsável pelo Programa de Trabalho.

Art. 8º O recurso orçamentário, objeto desta Portaria, correrá por conta do orçamento do Ministério da Saúde, devendo onerar o Programa de Trabalho 10.302.5018.8585 – Atenção à Saúde da População para procedimentos em Média e Alta Complexidade – Plano Orçamentário 0005 (Fundo de Ações Estratégicas e Compensação – FAEC).

Art. 9º Cabe à Coordenação-Geral de Gestão de Sistemas de Informação em Saúde do Departamento de Regulação Assistencial e Controle (CGSI/DRAC/SAES) a adoção das providências necessárias no sentido de adequar os sistemas de informação do SUS geridos por este Departamento, com vistas a implantar as disposições a esta Portaria.

Art. 10º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação, com efeitos operacionais e financeiros a partir da competência novembro de 2023.

NÍSIA TRINDADE LIMA

 

 

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Link da portaria

 

(Jota Marcelo. Com SBAVC)

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