SAÚDE DO CORAÇÃO

DR. JOÃO JOAQUIM DE OLIVEIRA

Livre-arbítrio traz embutido um escárnio ético

Uma questão por demais sensível que sempre tem me deixado curioso e interrogativo tem sido a bipolaridade em que vivem as pessoas. Questão a que podemos também nominar de dualidade, ambivalência, dilema, entre outras. Mas, bipolaridade se revela mais adequado a essa tendência que pode se definir como se segue. Até na política estamos vivendo a chamada polarização.

Antes dessa conceituação faz-se necessário, por ser ilustrativo o chamado dilema (ou paradoxo) do asno de Buridan. Foi uma experiência do filósofo francês Jean Buridan (1300-1358). Também chamado de escolha de Buridan. Seria uma experiência para também ilustrar o livre-arbítrio. A experiência consistiu em colocar de forma equidistante de um burro um pacote de feno e um balde de água. E o animal com fome e sede teria que fazer a escolha. Ele usando de sua “racionalidade” iria morrer de fome e/ou sede! O que fazer? Matar a fome ou sede? Ou morrer da carência de ambos? Eis o dilema.

Vamos falar sore o livre-arbítrio (também chamado livre-alvedrio). Há uma concepção filosófica (ou metafísica) e uma teológica. Para melhor concepção, nos dias atuais, a semântica e a filologia podem nos permitir a sua desmistificação para melhor compreensão. Arbítrio pode ser entendido como vontade. Assim seria a livre vontade do gênero humano em decidir sobre seus desejos, planos, projetos ou objetivos dos aludidos desejos. Planos, projetos, objetos de desejo (lato sensu) são infinitos e incluem até nossos sentimentos, nossa crença ou amor em Deus (ser ou não crente em Deus). Ser incrédulo, agnóstico; ser ateu ou fiel ao criador. Até tais sentimentos, ou concepções se regem pelo livre-arbítrio. Assim seguem os indivíduos em suas humanas lidas de exercer a sua livre-vontade ou livre-arbítrio. Segundo a Teoria criacionista, Deus dotou o homem de livre-arbítrio.

No concernente à natureza ética e moral, estaria toda forma de livre-arbítrio correta e justa quanto à liberdade do livre agir, da livre ação? Imaginemos o exercício da livre-vontade na atitude de um usuário de drogas ilícitas. Um alcoólatra que também por décadas agiu com a prerrogativa de com tal dependência trazer dissabores, desavenças, conflitos conjugais entre outros transtornos sociais ainda na sua plena higidez física e mental. Mas, o tempo corre, esse alcoólatra vai ter tantas doenças e se tornar agora um doente com sequelas e perenemente incapacitado para sua vida laborativa e atividades sociais.

O que dizer agora daquela livre-vontade de se entregar a um vício tão nocivo e agora depender de tanto sacrifício de seus cuidadores? (filhos, parentes, enfermeiros, profissionais de saúde). Que significado ético teve o livre-arbítrio desse alcoólatra para com seus familiares e parentes que com ele se coabitavam? O mesmo raciocínio ético e moral se pode fazer com muitas outras experiências e opções de relações do homem com os seus semelhantes e meio ambiente. Assim ocorre com o livre-arbítrio do cocainômano, uma pessoa maconha-dependente, etc. Assim, naquela livre escolha, o sujeito dessa liberdade jogou fora todos os postulados éticos e morais no concernente àqueles à sua volta, seus familiares, filhos, cônjuge, cuidadores. Que Direito me assiste de fazer o que bem quiser, mas como consequência, prejudicar pessoas, parentes, cuidadores, de quem vou me tornar continuamente dependente?  Nesse sentido basta relembrar o conceito, a definição de ÉTICA, que é um sentimento, ou um expediente de sempre fazer o bem, não importa a quem.

A bipolaridade tem muito a ver, muitos pontos de comunhão com a prerrogativa do livre-arbítrio. Muitos são os cenários da vida em que ela se manifesta. Até mesmo como bem o ilustra o fenômeno mórbido psíquico denominado transtorno bipolar, originalmente intitulado psicose maníaco-depressiva. Tal afecção psiquiátrica se caracteriza pela bipolaridade humor alegre e humor triste. Assim tem-se o polo maníaco, onde o indivíduo doente se mostra muito expansivo, ridente e hilariante. E o polo depressivo, quando o paciente se torna ensimesmado, introspectivo, retraído, triste e sem alegria (anedonia em psiquiatria). Nesse caso mórbido, que fique bem assentado: o indivíduo é inocente, inimputável, neutro, sem culpa porque ele é vítima de um transtorno da fisiologia mental e cerebral, com sua homeostase neuropsíquica doente e precisa de psicotrópicos e psicoterapia.

Assim se dá a bipolaridade em muitas esferas do convívio humano. Assim, exerce cada um o seu livre-arbítrio, ou liberdade de ação. No econômico, quando o indivíduo tem a opção de ter um estilo de vida mais simples, sóbrio e frugal; mas, não resiste aos apelos do marketing do consumo, da vaidade e da imagem. Para tanto ele se opta para esse outro polo de vida com endividamento e financiamentos a taxas e juros escorchantes a perder de vista. Como consequência, nome inscrito em órgãos de inadimplentes (Serasa, SPC) e estado de falência. E nessa borrasca de irresponsabilidades podem muitos familiares e amigos ser levados de roldão.

De igual forma se dá no âmbito conjugal, assim se dá no campo profissional. É o viés ou inclinação do ser humano a essa dualidade, a não se firmar e decidir sem hesitação a uma opção de vida. Tal bipolaridade é encontradiça até numa questão sanitária de grande relevância e prevalência, o controle ponderal. Quantos não sãos os indivíduos no seu perpétuo movimento do engorda e emagrece. É um demonstrativo bem consistente da condição hoje tão presente da bipolaridade humana, em tantos cenários da vida. Mas, que é muito melancólico e instigante, da personalidade e das reações e expedientes do bicho homem, para com os outros de sua espécie. Disso ninguém diverge.

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