Cérebro no comando – Nosso cérebro é bom e perverso ao mesmo tempo
Nosso cérebro é um dos órgãos mais fantástico de todo o nosso sistema corporal. Tanto assim que a ciência tenta ao menos imitar o seu funcionamento. Mas ele não tem só virtudes. Quantas não são as doenças neurológicas que continuam sendo um enigma para a medicina? Quantas não são as doenças mentais incompreendidas pelas ciências. A própria mente das classificadas pessoas normais continua sendo um mistério para os pesquisadores. Nosso cérebro também não é de muito labor. Trata-se de um órgão preguiçoso. Ele não gosta de gastar energia. Não sem motivo gosta de ao menos umas oito horas de sono por dia.
Uma outra característica bem peculiar de nossa prodigiosa máquina é o fenômeno intitulado acomodação. Trata-se de um mecanismo de adaptação a uma condição ou estado de não bem-estar, nocivo, insalubre, enfim, anormal e desconfortável. Paradoxal, mas é isso mesmo. Mudar dá trabalho, gasta energia.
E quais são as características do intitulado fenômeno da acomodação? A principal é a latência de longo tempo. Uma outra de igual significado é a repetição ou continuidade do estado nocivo ou insalubre para gerar o fenômeno. Para mais clareza e materialização bastam alguns modelos.
Exemplo um. Imaginemos o indivíduo e sua estética corporal. Fosse possível a condição de a pessoa dormir e no dia seguinte ela se encontrar 20 quilos ou 30 quilos acima de seu peso normal. Certamente e com absoluta razão essa pessoa, de imediato, entraria em estado de pavor ou choque emocional, com exigência talvez de uma internação psiquiátrica.
Todavia, o mesmo ganho ponderal, ou mesmo em maiores percentuais em estágio até de uma obesidade mórbida, quando se faz de modo paulatino, de longo prazo, não traz nenhum dano ou abalo psíquico. Porque aqui sucedeu o fenômeno tão useiro e vezeiro da acomodação que ocorre em nosso sistema sensorial comandado pelo cérebro.
E assim ocorre com outros estados ou circunstâncias de natureza nociva, antissocial, insalubre e que traz algum dano físico ou psicológico à vítima.
São exemplos as relações humanas perturbadas e conflituosas, os assédios morais ou sexuais. A convivência continuada com pessoas de temperamento instável, de tratamento desrespeitoso e agressivo tem sido uma mostra bem robusta e típica do fenômeno da acomodação. A pessoa vai assumindo uma atitude de tolerância, de aceitação, de subserviência ao agente ou ambiente nocivo. E tem-se então para ela, a vítima, uma condição de naturalização daquela relação, do ambiente hostil e de submissão ao agressor e condição de exploração.
Uma outra condição ou estado onde se constata o tão estudado fenômeno da acomodação refere-se ao processo de envelhecimento. Para tanto vamos imaginar que pudéssemos envelhecer uma pessoa em dez anos de forma acelerada. O indivíduo iria para o seu leito, se ele adormecesse e acordasse dez anos mais idoso que a noite anterior. Ao se olhar no espelho no dia seguinte, certamente que essa pessoa iria sentir profundamente sobressaltada pelas rugas e cabelos brancos a mais. Ou talvez até já sem cabelos (alvo). Um choque emocional e profunda tristeza.
Haveria, à semelhança da obesidade aguda um enorme pavor, uma crise aguda de depressão, muito sofrimento psíquico e necessidade imediata de tratamento psiquiátrico.
Por que o envelhecer lento e paulatino não causa nenhum espanto, nenhum sofrimento? Porque lenta, gradual e paulatinamente tem-se o tão protetor fenômeno da acomodação. E assim se dá com inúmeras outras condições na vida, nos ambientes de convivência humana. Basta um olhar atento às pessoas, à nossa volta, e constatar o quanto muitas delas passam pelo fenômeno da acomodação, a que muitos chamam também de comodismo ou zona de conforto. E então fica esse enigma de nossa prodigiosa máquina cerebral. Acomodar ao que é bom, prazeroso, saudável, tem até muita coerência e compreensão. Mas, vá lá entender por que acomodar ao que é tão nefasto e nocivo para a vida e para a saúde da pessoa.
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