Estética com ética – Por que se morre tanto em cirurgias plásticas e estéticas?
Uma vez mais, o Brasil e o mundo, puderam assistir e constatar o quanto a aparência sobrepaira e supera a essência que deveria imperar ao lado da existência. Nesse sentido estão por aí todas as ofertas de estética, de cosmética, de plásticas, de tanta coisa sintética que foi-se parar no lixo a esquecida deontologia e mesmo morrer qualquer diretriz ética. As rimas vieram de forma casual.
Paralelamente a tamanho descalabro de império das aparências, vieram a lume outras questões por demais encontradiças do Brasil contemporâneo. Qual é a diferença entre o que é legal, o que é lícito e ético em nosso País? Existe uma sigla PQD que encerra uma pergunta emblemática para nortear as ações humanas em sociedade. Será que tudo que eu posso e quero eu devo fazer (Posso-Quero-Devo?)? Tal instigante questão nos reporta ao Eclesiastes, que nos adverte: ‘Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém.’.
O caso modelo do mês refere-se a mulher que insatisfeita com suas nádegas (glúteos) procurou um cirurgião plástico sem as necessárias credenciais e qualificação para tal procedimento. Ato contínuo, e sem as necessárias cautelas da paciente, o procedimento se deu na própria residência do profissional, bairro da Tijuca (RJ). Houve complicações e a mulher veio a falecer. Pior que isso, no caudal de tamanho escândalo e desmedida insensatez vieram outros casos ao conhecimento público das autoridades, que agora estão a investigar tais ilícitos e criminais atuações profissionais pelo Brasil afora.
Eis que então várias perguntas foram trazidas a público.
Do lado da falecida. Como uma mulher, na madureza da vida, tida e havida como bem informada, se deixa ser operada, com um procedimento altamente invasivo, com injeção corporal de substância de alto poder de cair em vasos, e com isso provocar embolias de toda ordem, emergência essa das mais letais, por um profissional charlatão? O produto em questão foi o polimetilmetacrilato – PMMA.
Pior do que charlatão, em um cenário não hospitalar, sem as elementares condições assépticas e de assistência emergencial na hipótese de complicações no curso transoperatório.
Basta lembrar que qualquer procedimento que envolve sedação, analgesia e anestesia tem o potencial de complicações. Entre essas, de maior frequência, têm-se a hipóxia, a convulsão, a hipertensão ou hipotensão arterial, as arritmias cardíacas, as tromboses, o infarto do miocárdio e embolias. Todas de alto risco de morte súbita ou tardia em uma UTI; quem sobrevive pode portar sequelas pelo resto da vida.
Do lado do profissional – Como um sujeito que se diz médico, propõe a fazer um procedimento invasivo, em sua própria residência, sem os meios de monitoração das condições vitais e aparelhos de assistência emergencial, em caso de uma complicação perioperatória, que coloque em risco a vida do paciente?
Do ponto de vista ético e técnico e científico é no mínimo um sujeito abestalhado, aventureiro e irresponsável. São requintados erros de imprudência, negligência e imperícia médica. Conforme vem noticiando a imprensa, o infausto profissional da vez tem no curriculum vitae, um histórico de erros médicos, processos ético-profissionais, suspensão do exercício profissional e até participação em homicídio. Como noticiado, o dito-cujo profissional tinha registros nos conselhos de medicina de GO, do DF e RJ. Como tais disparates são aceitáveis? No Brasil pode.
Do lado do Conselho profissional (CRM); como se permite ao autointitulado médico, com uma folha corrida eivada de malfeitos, continuar no seu múnus de cuidar da saúde, das doenças, da vaidade e vida das pessoas?
Onde está consignado na cartilha do código de ética médica que um profissional com tais qualificadoras possa continuar exercendo um ofício tão nobre? Qual seja, o de promover a saúde, o bem-estar, a vida e a felicidade das pessoas.
E por fim, do lado da Justiça. Como bem o expressa, a Justiça (com J maiúsculo) existe para fazer justiça. Simbolicamente, a deusa Têmis, da mitologia grega, traz consigo uma balança (equilíbrio) e uma venda nos olhos. Por que de tais adereços? Julgar com equilíbrio e sem um juízo dos olhos, sem olhar a quem está aplicando justiça. Para esses objetivos em que se baseiam os operadores de justiça?
Em indícios, em relatos de testemunhas, em provas concretas de documentos, fatos, perícias. Como compreender, assimilar, aceitar a decisão de um magistrado que ante todas as provas de imprudência, imperícia e negligência libere um profissional médico para o exercício profissional? Tal natureza de decisão tem sido um fato recorrente em nosso País. Um médico comete lá um determinado ilícito, um grave erro no atendimento a um paciente, ele é suspenso do exercício profissional, vem uma liminar judicial com a permissão ao referido investigado, o cassado profissional, a que volte a atuar em sua especialidade.
Por isso ficam aqui essas inquirições que nos inquietam, o que é ética, o que é lícito e legal neste País?
No caso líquido e concreto em foco dos erros médicos ficam aqui algumas diretrizes. Médico se equipa a muitas outras profissões. A um ourives, a um sapateiro, a um advogado ou jornalista. Assim como há os rábulas e chicaneiros na advocacia, há os charlatões da saúde. Já disse em outros artigos que o pior charlatão em saúde é aquele que faz uma faculdade e tem diploma. Com o diploma, o indivíduo tem autorização ética (Conselho de Medicina, por exemplo) e legal para fazer o bem ou o mal. No Brasil com mais uma esquisitice vigente. Qualquer médico pode fazer procedimento de qualquer especialidade. Os Conselhos de Medicina e a lei assim o permitem. Não deveria ser. Mas é assim em nosso País.
Então a melhor segurança é: observar o histórico do profissional na comunidade onde ele atende. Se informar sobre os pacientes por ele atendidos. E mais importante, se informar no Conselho de Medicina e na Sociedade da especialidade. Com esses dados em mente se torna muito mais seguro passar por qualquer procedimento cirúrgico ou invasivo. E importantíssimo, fazer exame pré-operatório com um cardiologista, além dos hematológicos indispensáveis para o procedimento.
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