SAÚDE DO CORAÇÃO

DR. JOÃO JOAQUIM DE OLIVEIRA

DR. JOÃO JOAQUIM DE OLIVEIRA é especialista em Medicina Interna e Cardiologia, Assistente do Serviço de Cardiologia e Risco Cirúrgico no Hospital das Clinicas – Faculdade de Medicina / Universidade Federal de Goiás (UFG) – Goiânia-GO; membro Sociedade Brasileira de Cardiologia; e, estudante de Filosofia.

Contatos: joaomedicina.ufg@gmail.com. Acesse: www.jojoaquim.blogspot.comwww.jjoaquim.blogspot.com.br

A vocação do cuidado (cuidadores)

De repente vêm surgindo ramos de estudos sobre alguns sentimentos humanos. E muitos desses ensaios, pesquisas sociais, antropológicas e psicológicas, trazem como gatilho a crise humanitária provocada pela pandemia da Covid-19, iniciada lá em dezembro de 2019. Claramente, os sentimentos de solidariedade, de fraternidade, de amor pelo próximo e mais seletivamente do sentimento de amor filial ou parental sempre foi estudado e compreendido. Todavia, a aguda crise sanitária, de sofrimento, de invalidezes, e mortes pela Covid realçaram esses debates; mais especificamente voltados à natureza, aos mecanismos íntimos, genéticos do cuidado.

Trazidos então à baila, torna-se oportuno uma breve resenha sobre as interpretações, a análise dos cientistas sociais e de psicólogos e psiquiatras sobre tão sensível e instigante questão, a do cuidado do outro. O porquê de muitas pessoas se dedicarem tão amorosamente a alguém, muitas vezes sem vínculo parental com esse indivíduo carente, frágil, doente e incapaz para as funções mais elementares da vida como a higiene pessoal, o uso correto e seguro de medicações prescritas, as refeições e hidratação, nos momentos de fome e sede? Eis a natureza e variações desses cuidados.

Um fator envolvido nos sentimentos de generosidade e no expediente do cuidado do outro é o genético. Nessa questão há como que um consenso de sua participação, como cristalinamente observado nas características biológicas, no fenótipo e anatômicas da pessoa. A semelhança e identidade entre um filho e os pais são muito grandes. Assim também se comporta a genética no referente aos sentimentos e no caráter do filho. Muitos desses traços são compartilhados geneticamente (genoma em ação).

Entretanto, em que pese os genes contribuírem para o bem e para o mal em muitas características biológicas e somáticas, e mesmo para a conduta e caráter do sujeito, quando se estuda os sentimentos da generosidade e do cuidado, pesam muito mais e de forma determinista (determinismo inevitável como referem os estudos) o padrão educacional e o legado social da família ou casa onde o sujeito foi criado e formado. E este é um ponto marcante: a um filho (a) não se dá apenas a criação, a engorda, a constituição física biológica de saúde corporal, de beleza e estética. Adicional e acima de todo esse investimento deve-se dar uma educação ética, social, humanitária e moral. É a construção da pessoa, desde criança como indivíduo cidadão (partícipe social e fraternal) com expedientes fundados no exemplo, no ensino e prática de ética e civilidade. A formação escolar será um complemento na formação técnica, científica e profissional produtiva.

Em breves termos, há como certo então que os sentimentos de umas pessoas, em especial os parentais, filhos e filhos, os sentimentos delas dispensados e dedicados ao outro; em especial a um pai ou mãe incapaz, debilitado e frágil; esses sentimentos sinceros, puros e espontâneos não são tanto inatos e genéticos. Eles resultam de como se deu a relação com o pai e a mãe, na sua criação, no seu modelo educacional. Como indicados nos estudos próprios, imaginemos aquele filho (a) que conviveu com um dos pais, ou os dois pais, com o estilo de vida negligente, irresponsável, descuidado do filho, que não teve um papel de bom educador, amoroso, protetor e pedagógico. Imagine ainda um contexto mais gravoso, do pai e/ou mãe, na condição de um adicto de substâncias ilícitas, castigos físicos e psicológicos aos filhos, de assédio moral! Tenebroso ambiente a imaginar. O que esperar de um filho ou filha, com criação e educação nessa atmosfera? As neurociências e a psicologia social respondem: essa criança, adolescente e futuro adulto, se formará com um padrão de relações com quem quer que seja, de desamor, de negligencia, de falto em altruísmo e generosidade. Não é que esse filho ou filha, se comportará negligente ou desamoroso por vingança. Ele assim, comportará por uma introjeção e formação ética e moral deformada, desumana e débil em empatia pelo outro, independentemente do laço parental. Se parente, ainda mais reprovável.

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