Lúcia e José Lúcio. Vida em família – O lado bom em um mundo desconcertado

Em Uruaçu, Lúcia dos Santos (mãe) é procurada por José Lúcio (Lucinho) (filho), morador de um grande centro. Que procura é essa? Qual é a história dos dois? Ela terá boa adaptação? A torcida é pelo sim da parte da mãe. Que seja realidade o melhor ajuste possível!

 

05/04/2019: Lúcia dos Santos e José Lúcio (Lucinho) no interior do Planalto Grill Churrascaria – Foto: @planaltochurrascaria

 

Vídeo de 05/04/2019: mãe Lúcia dos Santos e filho José Lúcio (e esposa dele) chegando para o almoço no Planalto – Vídeo: Planalto (via radialista Jucimar Alves)

 

05/04/2019: José Lúcio (e a esposa dele [à dir.]), em Uruaçu, com Nely Miranda (ex-curadora de Lúcia dos Santos) (esq.); e, Oneide Souza Leone (2ª à esq.), funcionária pública da Prefeitura de Uruaçu, também bacharela em serviço social – Foto: Grupo de WhatsApp/Oneide

 

Uruaçu, Centro: Lúcia dos Santos, em foto de Marcello Dantas (@levedeviagem), de 29/12/2010

 

Dezembro de 2008: Lúcia dos Santos e José Lúcio, na sede do Abrigo Betel – Foto: JORNAL CIDADE (Arquivo)/Prefeitura de Uruaçu

 

Em mais uma foto do final de 2008 (também publicada na página principal): a mãe e o filho dentro do Abrigo Betel – Foto: JORNAL CIDADE (Arquivo)/Prefeitura de Uruaçu

 

Visita anterior, no Abrigo Betel: à esquerda, Lúcia dos Santos e José Lúcio (de boné). Mãe se fazia acompanhada de Padre Crésio Rodrigues (então titular da Pasta da Promoção Social e, da conselheira Irani Francisca dos Santos. Motorista: Batistinha) – Foto: Prefeitura de Uruaçu

 

‘Quero compartilhar com vocês o quanto fiquei feliz aqui no Planalto hoje.

Muitos conhece a Lúcia (aquela senhora morena que anda catando lixos nas ruas de Uruaçu com montes de cachorros).

Quem se lembra que ela teve um filho, chamado Luciano, que aos 7 anos de idade foi tirado dela e levado para um orfanato próximo a Brasília.

Hoje ele apareceu aqui no Planalto com ela, me disse que veio buscá-la para morar com ele em Brasília. Tava acompanhado da esposa, hoje tem sua própria casa e quer cuidar da Mãe.’.

 

A postagem acima (acompanhada da primeira foto desta publicação do JORNAL CIDADE), em conta do Planalto Grill Churrascaria em rede social dia 5 de abril de 2019, chama atenção de muitos, especialmente dos que testemunharam a relação Lúcia dos Santos-José Lúcio (Lucinho), dois personagens de visibilidade grande em Uruaçu. Na visibilidade popular, a mãe e o filho criança que em boa parte dos anos 1990 e no início dos anos 2000 vagavam pelas ruas, lidando com lixo, acompanhados por cachorros (ou por cachorros). A higiene era quase zero.

Em dezembro de 2008, o JORNAL CIDADE (escolhido espontaneamente pela Prefeitura de Uruaçu para ajudar propagar boa notícia envolvendo os dois) publicou na edição 86, na página 2, conteúdo focando o reencontro de mãe e filho, em uma visita que Lúcia lhe fez (nesse tempo, já um adolescente, com 14 anos), então interno há cerca de seis anos do Abrigo Betel, sediado em Cocalzinho-GO.

A visitação serviu para encerrar a boataria de que o filho havia morrido em acidente automobilístico.

 

Ele deixou de vagar

O ato de ter sido direcionado – adequadamente, corretamente –, pelo Conselho Tutelar uruaçuense (presidido na ocasião por Rose Mary Rios Spíndula), em parceria com a Secretaria Municipal de Promoção Social (era comandada por Estela Coêlho Galvão) para o Abrigo foi alvo de críticas da parte de determinadas pessoas (enquanto outras concordaram), mas, a realidade é que o menino de apenas sete anos passava por situação cheia de falta de humanidade. Bastava a matriarca! Rose e Estela: excelentes profissionais, eficientes em suas atuações profissionais!

Frisa-se que mãe e filho receberam outros auxílios na época, inclusive uma moradia popular. A Prefeitura de Uruaçu e o Conselho Tutelar se preocuparam com a situação degradante e agiram. Porém, é impossível obrigar qualquer munícipe tomar algumas atitudes.

Passaram os anos, na condição de interno ele apresentou bom comportamento, saiu para vida (no bom sentido), se dirigiu ao Distrito Federal (o populoso Distrito Federal e a sua região do Entorno), chegou a fase adulta, casou, conquistou um lar, uma vida totalmente oposta aos tempos péssimos em que andava sem rumo com a mãe, que permaneceu em Uruaçu… Vagando da mesma forma por tantos e tantos anos.

Na publicação de 2008, o JORNAL CIDADE realça, elogia a iniciativa de a mãe ser levada para visitar o filho e o periódico mira, de forma esperançosa, positiva, no futuro de José Lúcio. Confira abaixo: MÃE LÚCIA, FILHO LUCINHO.

 

Ela se adaptará? Tomara!

Se Lúcia dos Santos se adaptará com a nova vida, morando em diferentes cidade, lar, rotina, cultura, hábito (com diferentes e produtivas [no bom sentido] pessoas), só o tempo determinará. A torcida é pelo sim da parte da mãe, ainda mais que vida em família é algo sagrado e positivo, principalmente em um mundo com problemas e conflitos de sobra.

Difícil. Muito difícil uma mãe criar um filho como ela criou durante pouco mais de sete anos. Bonito. Lindo o mesmo filho procurar a mãe neste 2019, visando oferecer identidade, dignidade para ela, tendo a genitora ao lado, na mesma casa.

Em respeito a ambos, o JORNAL CIDADE optou por não procurar esses dois tão importantes personagens da vida… Vida! Vida!… Personagens seres humanos e irmãos de todos os demais seres humanos.

 

Jornal Cidade, edição 86. Dez de 2008 – Acesse este link e confira! Dezembro de 2008: JORNAL CIDADE publicou na edição 86 conteúdo destacando o reencontro entre a mãe e o filho, na primeira visita que Lúcia fez ao interno José Lúcio. Nota atual: o correto é uma visita (segundo parágrafo); e, reencontro da mãe (Nota da Redação [final do texto])

 

Uruaçu, Centro: Lúcia dos Santos, em foto de Marcello Dantas (@levedeviagem), de 29/12/2010

 

Dica de leitura: no Overmundo, website colaborativo sobre a cultura brasileira, a uruaçuense Sinvaline Pinheiro tem publicado um texto (naturalmente aprovado por uns, não aprovado por outros [Sinvaline é boa pessoa e não agiu de má-fé; isso não é do feitio dela]), destacando a mãe e o filho. Abaixo, o JORNAL CIDADE transcreve o trabalho da escritora e poeta (entre outras qualificações). Leia:

 

LÚCIA

 

A figura é bem conhecida por todos: negra alta, suja e banguela. Os peitos enormes descem até à barriga e com um pano na cabeça sai às ruas pedindo e conversando só.

 

À noite dorme sob o efeito da cachaça que ganha. Alguém se aproveitou disso e a engravidou. À medida que a barriga foi crescendo ela a apalpava e sorria entendendo que tinha um filho ali. Acariciava o ventre sorrindo e balbuciando algo incompreensível.

 

A praça foi o lugar do parto, o cordão umbilical foi cortado nos dentes e quando o neném chorou ela o escondeu debaixo das saias sujas. Depois que o dia clareou sorrateiramente ela desceu as ruas e lavou o bebê nas águas poluídas do córrego Machambombo.

 

Quando já estava (limpo?) o embrulhou em suas anáguas e o neném se saciou no leite dos peitos enormes cheios de leite.

 

O bebê fez com que ela ficasse numa posição de ataque: ninguém chegava perto, talvez temesse que lhe roubassem a criança. O ciúme era tanto que poucas pessoas conseguiram ver o rosto do dele, só ficou conhecido mesmo quando começou a acompanhá-la pelas ruas pedindo comida.

 

Quando o menino já contava com mais ou menos oito anos alguém se incomodou de ver a criança com ela pedindo nas ruas e aí começaram as denúncias e o Conselho Tutelar interferiu.

 

Ela enlouqueceu de vez pois queriam roubar seu filho. Mas mesmo assim o levaram para uma instituição que abriga menores.

 

Agora ela anda pelas ruas, quase não sorri. Conversa sozinha e chama o filho…

 

Às vezes pega o telefone público e fica falando com alguém como se fosse ele, dizendo que está com saudade…

 

Hoje Lúcia já tem uma casa doada pela Prefeitura local, recebe cesta básica e não bebe mais pinga; porém o olhar e as palavras são mais tristes.

 

Ela já faz parte da paisagem da cidade e em todos os lugares está sempre balbuciando palavras incompreensíveis.

 

Tentei uma aproximação maior, fui à sua casa. Demorou abrir o portão e quando fui entrando me pediu para limpar os pés apesar da sujeira do piso.

 

Todo o lixo recolhido nas ruas é organizado em prateleiras onde se vê de tudo um pouco. Chamou-me atenção os livros velhos, alguns até raros. Perguntei se sabia ler, ela sorri e sacode a cabeça que não.

 

No quintal já não tem como andar de tanta coisa entulhada, mas tudo organizado conforme a cabeça dela, tudo tem uma hierarquia e um lugar certo.

 

Quando lhe pergunto do filho ela diz:

 

– Ele ta lá… O Lúcio tá lá, vou buscar ele…

 

Só que para ela o filho ainda é um menino pequeno, em sua cabeça não o vê crescido.

 

O pessoal da Ação Social de Uruaçu a levou para uma visita e ela voltou como se não tivesse visto nada ou talvez encontrado uma pessoa estranha, seu filho ainda é aquele que foi para o abrigo, não cresceu.

 

A meninada diz:

– Lá vem a Lúcia doida!

 

Mas não a incomoda, ela se sente parte da paisagem, agora sempre acompanhada por um cachorro.

 

A cidade já se acostumou com essa figura excêntrica que não gosta de roupas novas nem limpas; gosta dos trapos que incluem saias longas, blusas de babados onde os rasgões e às vezes uma peruca toda colorida, lhe dão um ar altivo, majestoso.

http://www.overmundo.com.br/banco/lucia-personagem-majestosa

 

(Jota Marcelo. Com atualizações)

5 Comentários

  • Herbert Leonardo Radi Arrais (Jaraguá-GO)

    Parabéns JORNAL CIDADE pela matéria muito emocionante! Eu convivi com parte dessa história, Lúcia era vizinha de nossa família em uma casa abandonada na rua José do Patrocínio, tempos difíceis, que minha mãe ajudava com comida e roupas. A noite do nascimento do Lucinho jamais sairá da minha cabeça. Parabéns mesmo, me emocionei muito lendo a matéria, me passou um filme pela cabeça!

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  • Amaraildo Antunes Viana (Goiânia-GO)

    Gostaria de saber quem é o pai dele. Quando nasceu eu ainda morava em Uruaçu e, muitas pessoas falavam que o pai dele era morador de rua também, apelidado de ‘Pé de Pano’.

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