Maiores economias do mundo se preparam para um 2020 desafiador; ainda sem se recuperar da última crise interna, Brasil fica sob risco maior
Uma notícia ruim para a comunidade global e sobretudo para os brasileiros pode estar prestes a chegar: existe a chance de uma nova crise financeira global no próximo ano. O economista americano Nouriel Roubini, que ficou conhecido como “Dr. Apocalipse” por ter previsto a crise financeira global de 2008, cujo gatilho foi a falência inesperada do banco Lehman Brothers, prevê uma “crise financeira” e uma “recessão global que deve afetar todos os setores da sociedade em 2020.
Num artigo de opinião no jornal “Financial Times” assinado em conjunto com Brunello Rosa, Roubini constata que está se desenhando um cenário propício para o surgimento de uma nova crise global. Fundadores da consultoria Rosa & Roubini Associates, os economistas foram convidados pelo jornal para escreverem uma análise de como vai a economia mundial mais de dez anos após a falência do Lehman Brothers.
De acordo com os renomados economistas, a expansão global deverá continuar nos próximos dois anos, porque os EUA apresentam grandes déficits orçamentários, a China continua apostando em políticas de estímulo e a Europa prossegue em busca do caminho da recuperação econômica. No entanto, há vários fatores que podem criar as condições necessárias para uma recessão mundial e uma crise financeira em 2020.
A contínua subida dos juros por parte do Banco Central dos EUA atingirá índices considerados altos demais nos primeiros meses de 2020. A previsão é que chegue a cerca de 3,5%. Curiosamente, é uma taxa que ainda é menor que a atual praticada no Brasil. Ainda de acordo com os economistas, a política de ruptura de acordos que tem sido seguida pela administração de Donald Trump vai ter um efeito negativo nos EUA, causando o aumento da inflação.
Há outros dois fatores que devem afetar a economia americana. Existe a previsão de que a China começará a sentir os efeitos do alto endividamento causado pelos estímulos econômicos dos últimos anos e o ritmo da atividade econômica na Europa irá diminuir, graças a redução dos incentivos promovidos até hoje pelo Banco Central Europeu. Todos estes ingredientes devem contribuir para a criação de uma crise financeira e uma recessão global. É como se uma bolha estivesse prestes a estourar. O problema maior é que as respostas políticas serão “menos eficazes” do que as que estavam disponíveis há dez anos. Talvez seja o momento de o capitalista se reinventar.
Brasil deve se preparar para a possível crise
Em momentos de grande incerteza, os investidores globais tendem a sair de mercados emergentes, como o brasileiro, considerados mais arriscados, e partirem em busca de segurança em ativos considerados mais sólidos, como os títulos do Tesouro norte-americano, ou mesmo o ouro. Esse é o movimento que justifica a forte queda da Bolsa brasileira e a valorização do dólar frente ao real, segundo os especialistas. No entanto, o impacto de uma possível desaceleração global não se limita à forte variação dos ativos financeiros. O Brasil pode, efetivamente, sentir profundamente os impactos da nova crise, caso ela se confirme nos próximos meses.
O atual governo brasileiro está seguindo uma linha econômica liberal ortodoxa, no intuito de reconstruir a confiança dos investidores no país. Em cenários de crise como o que está se desenhando, esse governo tende a promover o estímulo da oferta de produtos, em vez de gerar demanda, como fizeram os governos anteriores. O problema que vem disso é que o resultado desse mecanismo é muito lento, ainda mais para um país que sequer saiu de uma crise interna. Outras medidas adotadas, como a redução do compulsório dos bancos e a liberação do FGTS, têm efeito pontual e não seriam suficientes para enfrentar uma crise internacional severa.
O governo teria a opção de aumentar os gastos públicos por meio de investimentos em infraestrutura, como incentivo à economia. Mas essa hipótese é muito remota, considerando a linha econômica do governo. Deixar a responsabilidade para iniciativa privada também não vai resolver. A iniciativa privada não quer investir com medo de não conseguir vender. Por outro lado, se o governo conseguir aprovar as reformas estruturais, como a da Previdência e a tributária, os efeitos da crise sobre o país seriam amenizados.
Ainda se sabe qual será a dimensão dessa recessão global, caso ela se confirme. Se ela não for tão grave como a de 2008, há uma chance de o Brasil superá-la com certa tranquilidade. Se o governo fizer o dever de casa com as reformas, a confiança dos empresários e dos investidores pode ser restaurada. Em um cenário ruim no mercado internacional, o Brasil seria uma espécie de escolha seletiva. O investidor estrangeiro olha Brasil e Argentina, por exemplo. Se aqui tiver reforma feita, compromisso com responsabilidade fiscal, a chance de direcionar os recursos para o Brasil é maior.