‘REFLEXŌES EM TORNO DE UM LIVRO.’ – Itaney Campos
Amigos,
“Leva-se mais tempo para gestar um livro, do que para gestar um homem”. Alguém poderia ter disso isso, que é uma pura verdade. Mas se não o disseram, fica dito agora. Claro que poderiam argumentar que para se fazer um homem é preciso nascer, crescer e amadurecer biologicamente, resultando o novo ser da conjunção de um homem e uma mulher. Mas também o livro, caríssimos, exige a junção da inteligência e da sensibilidade, somados à disciplina da escrita. Vezes há em que nem toda uma vida é suficiente para se escrever um livro. E como os filhos, os livros, após frutificados, deixam de ser nossos, porque, como disse o poeta, vêm através de nós, mas não de nós, e refletem a ânsia da vida. E este que aqui e agora se traz a público teve uma gestação longa e difícil, reconheça-se, mas com o seu advento dissipam-se os aborrecimentos, as dores e os contratempos.
Ele seguirá o seu curso, construirá a sua história e dentro dela a nossa história, porque é fruto de múltiplo artesanato, uma tessitura complexa, em que se justapõem e se entrelaçam variadas narrativas pessoais, todas elas jungidas por um tear único: a atividade de prestação da justiça. É que reúnem-se neste livro os relatos dos membros deste Tribunal, homens e mulheres que se dedicaram à difícil e delicada tarefa de aplicar a lei, mas não só aplicar a lei, mas aplicá-la reverenciando a dignidade qualificadora de toda pessoa humana, sobremodo os que confiam na justiça terrena, fruto das circunstâncias históricas.
Há neste livro um pouco de cada uma de suas personagens, seu trajeto, suas esperanças, seus sucessos e fracassos, e seus amores, ainda que mal revelados ou delineados nas sombras da autocensura. Há também narrativas de medo e solidão, como as há de brilho e glória. São discursos proferidos em momentos marcantes na carreira de cada um de nós, o momento em que assumimos o posto de desembargadores e, assim, julgadores da instância superior da Justiça Estadual. Benditos os que saciam aqueles que têm fome e sede de justiça, para parafrasear a Sagrada escritura.
Agora que o fruto é colhido, relembra-se, com regozijo, que sua semente foi lançada ao solo pelo poeta Gabriel Nascente, sob as bênçãos da Comissão Permanente de Memória e Cultura do TJGO, onde perfilam seis desembargadores (não me refiro a mim), todos de escorreito trajeto e dedicação ao lavor cultural, professores, escritores e julgadores retilíneos. É com grande alegria que constato a não realização do vaticínio do desembargador Luiz Cláudio, ao perorar, cansado dos esforços pela publicação do livro: “Pelo andar da carruagem, eu morro e não vejo este livro publicado.”. Pois enganou-se a estimado parceiro. O livro aí está: A Tribuna dos Magistrados é o seu nome. Perfeito ou não, aí está, para o deleite de quem souber usufruir dos frutos que ele oferece, do seu sumo, do seu mel, e da sua acidez, que também disso se haurem lições. Lembrem-se: não há criatura humana perfeita. Mas todas elas têm os seus dons e seus talentos. Sejam complacentes com ele, afinal houve esforço dos envolvidos em sua produção.
Neste livro não encontrarão apenas peças de retórica. Ele se constitui de retalhos e cenários de vida, nas suas páginas se poderão ver e sentir risos e lágrimas, episódios de alegria e instantes de pesar, palavras de humildade e expressões de glória pessoal, porque o livro é um acervo composto de patrimônios vitais. Nos seus subterrâneos há sangue e lágrimas, e ainda que a expressão pareça forte, é verdadeira. De se ressaltar que a coletânea se constitui em forma de reconhecimento ao trabalho desenvolvido pelos julgadores deste Sodalício, uma maneira de preservar a sua história, que se entrelaça à memória institucional, parte que é da trajetória histórica do Poder Judiciário goiano, especialmente do Tribunal de Justiça, na altura dos seus 148 anos de existência, a contar da instalação do Tribunal da Relação de Goiás, no ano de 1874, por força de decreto imperial.
Para quem tiver sensibilidade para ler, será o testemunho de dramas e triunfos. Na ribalta, o movimento dos protagonistas da família, dos companheiros de jornada, dos tempos de fartura e de vacas magras, ou seja, as estações percorridas pela alma humana. O grande tribuno que foi o padre Antônio Vieira proclamava: “O livro é um mudo que fala, um surdo que responde, um cego que guia, um morto que vive.”. Compartilhemos, pois, dessa vivência luminosa.
[Junho/22.
Itaney Campos, natural de Uruaçu, é, entre outras funções, escritor, poeta, membro da União Brasileira de Escritores (UBE) – Seção Goiás, da Academia Goiana de Letras (AGL), da Academia Goiana de Direito (Acad), da Academia Uruaçuense de Letras (AUL), do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás (IHGG), desembargador e atual presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-GO)
Nota da Redação do JORNAL CIDADE: leia reportagem focando o lançamento do livro, clicando aqui
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